segunda-feira, 3 de setembro de 2012

Pedido tardio de desculpas da fabricante da talidomida não basta às vítimas

Passadas mais de cinco décadas, farmacêutica alemã Grünenthal pede desculpas pelo escândalo envolvendo sedativo utilizado por grávidas nos anos 1950 e 1960. Vítimas de má formação querem mais do que apenas palavras. 

A empresa farmacêutica alemã Grünenthal, fabricante da talidomida, finalmente pediu desculpas às vítimas do medicamento, vendido para mulheres grávidas do mundo todo nos anos 1950 e 1960 como tratamento para enjoo matinal. Cerca de 10 mil bebês nasceram com defeitos causados pela droga, a maioria com má formação nos membros ou sem braços ou pernas.

O encarregado do governo alemão para portadores de deficiências, Hubert Hüppe, saudou o pedido de desculpas da fabricante do remédio, vendido na Alemanha com o nome de Contergan. "Já era tempo. É bom que ela o tenha feito e finalmente admita sua culpa como empresa", disse à Deutsche Welle. Hüppe considera positivo para as vítimas que a fabricante finalmente tenha se desculpado.

A associação alemã de vítimas do Contergan reagiu com ressalvas. "Ficou claro que a empresa lamenta o que aconteceu", afirmou a porta-voz Ilonka Stebritz. Porém, diz ela, não se pediu desculpas pela produção do medicamento tóxico. "A Grünenthal continua usando as mesmas palavras de sempre. A palavra 'desculpas' só aparece quando se trata da comunicação, que por mais de 50 anos só silenciou [sobre o assunto]", considera.

Maior escândalo farmacêutico da Alemanha

Recém-inaugurado memorial às vítimas da talidomida é alvo de críticas

O pedido de desculpas pelo maior escândalo farmacêutico da história da Alemanha foi proferido pelo presidente da Grünenthal, Harald Stock, por ocasião da inauguração de um memorial para as vítimas da talidomida na última sexta-feira (31/08) na cidade de Stolberg. "Pedimos desculpas por não ter encontrado o caminho até vocês [as vítimas], de pessoa para pessoa, ao longo de 50 anos. Em vez disso, silenciamos”, disse Stock.

O sedativo foi introduzido pela empresa no mercado nos anos 1950. Era possível comprá-lo sem receita médica, e ele era indicado principalmente a mulheres grávidas. Mas a substância ativa talidomida provocava sérios problemas de má formação em fetos. Dos cerca de 10 mil casos de bebês vítimas do medicamento mundo afora, cerca de 5 mil ocorreram na Alemanha. Por volta de 40% deles morreram ao nascer ou pouco depois.

Em 1961, a Grünenthal retirou a droga do mercado, sem reconhecer sua culpa. Entretanto, a empresa comprometeu-se a pagar o equivalente a 100 milhões de euros à uma fundação para as vítimas. Em 2009, seguiram-se mais 50 milhões de euros.

Agora, finalmente veio o primeiro pedido de desculpas. Mas o próprio memorial em cuja inauguração as palavras de perdão foram proferidas é controverso. O local de pouco destaque, num centro cultural da pequena cidade no oeste alemão, foi alvo de críticas, sob a alegação de que a Grünenthal utilizou um projeto de baixo custo para se promover. A empresa pagou 5 mil euros pela iniciativa.

Crianças são hoje adultos
O memorial não é suficiente para a associação alemã de vítimas do Contergan. "Nossos membros claramente disseram 'não' a essa escultura com o nome A criança doente", disse Stebritz. Segundo ela, não se pode classificar as vítimas como doentes. "Doenças podem ser curadas, mas os danos da talidomida não. Nossas pernas e braços não vão crescer", afirmou. Além disso, não se trata mais de crianças. "Somos adultos com 50 anos ou mais."

Com a idade, aumentam também os desafios para as vítimas. Um estudo encomendado pelos principais partidos políticos alemães constatou que os danos da talidomida são muito mais graves do que se pensava. "Os diferentes tipos de deficiências têm efeitos maiores com a idade", declarou Hüppe. Isso exige medidas políticas e apoio imediato.



Vítimas do medicamento são hoje adultos e enfrentam dificuldades

Stebritz considera a situação das vítimas da talidomida na Alemanha crítica. "Temos deficits tanto no abastecimento de remédios quanto no financiamento de adaptações em carros e no ambiente doméstico." Exatamente pelo fato de os afetados pelo medicamento ficarem cada vez mais velhos, seria importante conseguir mais meios para financiar as necessidades deles, cujos custos aumentam com a idade.

"Com uma dentadura comum paga pelo sistema de saúde, por exemplo, não podemos fazer nada. Também usamos nossos dentes como ferramentas", explica Stebritz. Para abrir uma garrafa, por exemplo, uma dentadura comum não serve, pois quebra com facilidade. Stebritz vê o pedido de desculpas da Grünenthal como um gesto humano, mas as palavras precisariam vir acompanhadas de ações.

Além da Alemanha, a maioria das vítimas da talidomida vive no Reino Unido, no Japão, no Canadá e na Austrália. Casos de má formação também ocorreram no Brasil.

Autor: Olé Kämper (lpf)
Revisão: Alexandre Schossler

Fonte:  Site DW

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