terça-feira, 1 de novembro de 2011

Pesquisas universitárias a serviço da comunidade

Trabalhos desenvolvidos por estudantes começam a dar resultados saindo dos muros da universidade.
Gustavo Cidral
 
Muitos estudos realizados nas universidades parecem não sair dos muros dos campus. A falta de aplicação prática de muitos trabalhos no cotidiano das comunidades algumas vezes frustra os acadêmicos. Porém, a situação para alguns estudantes de Jaraguá do Sul é bem diferente. Eles estão podendo compartilhar o conhecimento com a sociedade e ver o resultado de seus projetos na realidade das pessoas.

Um lanchinho sem riscos à saúde
Um trabalho desenvolvido no curso de Tecnologia em Alimento, da Católica de Santa Catarina, é exemplo de como pesquisas universitárias influenciam no cotidiano. Quem nunca parou em um desses trailers que vendem lanches na beira das ruas da cidade, principalmente à noite, por causa da pressa ou pela tentação do cheiro que invade os carros que passam nas vias? Mas, será que esses locais têm as condições sanitárias adequadas para a venda de alimentos? Ou será que os manipuladores dos ingredientes têm o preparo e o conhecimento necessário para ter contato com o que você vai comer?
Foi pensando nessas questões que as acadêmicas Eloize Andressa Krause e Jéssica Ehmke Kraetzer, da 4ª fase do curso, desenvolveram um trabalho para analisar as condições higiênico-sanitárias no comércio de lanches rápidos de Jaraguá do Sul. Elas começaram a pesquisa na primeira fase do curso, no projeto de iniciação científica, e receberam recursos do CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico).

 Alunas desenvolveram trabalho para analisar as condições higiênico-sanitárias no comércio de lanches. (Foto: Marcele Gouche)
Na ida a campo, a parte prática do trabalho, as alunas visitaram, sem aviso prévio, 34 trailers em toda a cidade. As pesquisadoras chegavam ao local, se apresentavam como acadêmicas, explicavam o que estavam fazendo, pediam permissão aos proprietários e preenchiam um questionário com base nas observações. “Todos toparam, mas alguns ficaram com receio”, conta Jéssica. As avaliações foram feitas em duas semanas, entre 19 e 23h, horário em que os pontos funcionam.

As estudantes basearam a pesquisa de acordo com a normativa RDC 216 da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária). Foram quatro blocos de avaliação: condições ambientais e edificações; condições higiênicas de utensílios e equipamentos; perfil dos manipuladores; matérias-primas utilizadas, controle de qualidade do ponto de venda. Os critérios eram preenchidos como satisfatório, razoável ou insatisfatório.

De acordo com as alunas, alguns manipuladores ainda não têm a prática de higiene básica, como usar luvas e touca ou lavar as mãos. Alguns estabelecimentos apresentaram produtos com validade vencida e armazenados inadequadamente. “Pelo que a gente viu, o ambiente é prioridade nesses locais e não o produto”, afirma Jéssica.

Apesar dos pontos negativos, o resultado final foi razoável, com médias altas nas condições ambientais e edificações e condições higiênicas de utensílios e equipamentos. As alunas garantem que continuam comendo lanches vendidos em trailers e iriam à grande maioria dos locais visitados.

No que o projeto pode ajudar
O trabalho foi apresentado no 11º Congresso de Iniciação Científica, realizado pela Católica. Todos os proprietários dos comércios foram convidados para assistir e conhecer o resultado da pesquisa. Relatórios individuais de cada ponto estão disponibilizados para cada comerciante aplicar em melhorias dos espaços.

As estudantes foram orientadas pela professora e coordenadora do curso, Silvia Helena Figueiredo, que também é membro do Conselho Municipal de Segurança Alimentar (Comsea). Segundo a professora, o resultado da pesquisa foi encaminhado para órgãos competentes a fim de propor cursos de capacitação em boas práticas de manipulação e produção de alimentos. “A ideia é propor à Vigilância Sanitária um curso de capacitação para os manipuladores quando os alvarás sanitários são liberados”, explica.

Fique atento! Repare nas condições dos locais em que você come. Veja o que a pesquisa conclui sobre a observância da 

RDC 216 da Anvisa nos 34 trailers avaliados:

PONTOS ACEITÁVEIS
Uso de água encanada e tratada: 100%
Boa iluminação na área comercialização dos lanches: 85,3%
Presença de sanitários para os fregueses: 88,23%
Utensílios e equipamentos em bom estado de conservação: 94,11%

PONTOS NEGATIVOS
Ausência de lavatórios para a higienização das mãos: 76,4%
Uso de lixeiras manuais ou sem tampas: 88,24%
Lixeiras instaladas próximas à área de preparação dos alimentos: 97%
Ausência de uniformes: 85,3%
Uso de adornos, maquiagem, bijuterias, relógios, unhas longas e os homens com barba: 91,18%
Mascar chicletes e conversar durante o preparo: 11,76%
Não utilizam toca: 97%
Não usam luvas: 94,1%
Manipulação de dinheiro durante a preparação dos alimentos: 79,41%
Matérias-primas armazenadas em sua embalagem original, como latas de alumínio: 67,6%
Maionese e ketchup em bisnagas e não em sachês individuais: 55,9%
Matéria prima para uso com prazo de validade vencido: 8,8%
Preparo de alimentos cárneos fora das condições de refrigeração: 58,82%


Miriã Rocheli Schneider e Rafael Jungton contribui para evitar problemas futuros. (Foto: Eduardo Montecino) 
Ajudando a evitar problemas futuros
Pesquisa desenvolvida por alunos da 4ª fase do curso de Tecnologia em Gestão Ambiental, da Católica de Santa Catarina, contribui para o desenvolvimento, preservação do meio ambiente e sustentabilidade do bairro João Pessoa.

Os acadêmicos Miriã Rocheli Schneider e Rafael Jungton realizaram o projeto "Diagnóstico Socioambiental do Bairro João Pessoa: Um Estudo da Situação Atual da Biodiversidade e do Planejamento do Ambiente Físico". O trabalho foi orientado pelos professores Cristiane Gascho, Fernanda Alquini e Murilo Teixeira. Segundo Cristiane, o objetivo foi avaliar os reflexos da urbanização e ocupação irregular. "Eles fizeram um ‘Raio X’ do bairro, detectando suas potencialidades e fraquezas", explica.

De acordo com a estudante Miriã, o João Pessoa foi indicado pela coordenação por ser um lugar com bastantes elementos e características que englobam todo o município. “Lá tem rio, rodovia, morro, região urbana e vegetação rural”, esclarece.

Somente neste ano, o bairro contabilizou 115 casos de alagamentos e 34 deslizamentos. Os desastres naturais põem em risco a vida de muitos moradores que invadem áreas de preservação. A ocupação desordenada é um reflexo do grande crescimento populacional da região, que segue a média de Jaraguá do Sul: 3,8% — o triplo de todo o Brasil.

Conhecendo e diagnosticando o problema
Após a etapa teórica do trabalho, os pesquisadores foram ao local estudado durante seis sábados seguidos. Lá, eles constataram a diferença entre analisar a região nos mapas cedidos pela Prefeitura e a situação real da comunidade. “A realidade é muito diferente. O crescimento é muito acelerado e os mapas desatualizam facilmente”, conta Rafael, que conseguiu observar mudanças nos poucos dias em que visitou o bairro. Segundo ele, o rápido crescimento dificulta o acompanhamento técnico pelos órgãos responsáveis.

Um dos sábados foi dedicado a entrevistas com moradores antigos da região. Eles relataram que a fauna e a flora mudaram bastante na localidade em 30 anos. “A vegetação do morro agora é outra, depois que alguns habitantes foram deslocados por risco de desmoronamento”, explica Rafael. “A ausência da influência humana no ambiente faz com que a flora original volte a nascer”.

Os estudantes tiveram o apoio da Secretaria de Defesa Civil e de Planejamento de Jaraguá do Sul na de busca de dados.
 
Projeto pode ser utilizado em outros locais
De acordo com a orientadora Cristiane, o relatório será encaminhado ao Executivo municipal com a intenção de desenvolver políticas públicas que possam amenizar os problemas do local causados pela ocupação desordenada. Além disso, a metodologia utilizada pelos acadêmicos pode ser aplicada em outros bairros. “Além do diagnóstico do bairro João Pessoa, que pode ser usado para aplicação de políticas públicas, a metodologia pode ser reaplicada em qualquer lugar” explica a professora.

Empreendedorismo é estimulado
Um projeto interdisciplinar tem estimulado o empreendedorismo em alguns acadêmicos da Católica de Santa Catarina. Alunos dos cursos de Engenharia de Produção, Engenharia Mecânica e Engenharia Elétrica trabalham juntos em uma fábrica montada na própria universidade.

A iniciativa do projeto foi do professor Wilmar Mattes, que leciona para os três cursos. Segundo ele, a intenção é colocar em prática todo o conhecimento teórico adquirido em sala de aula e estimular os alunos a serem empreendedores.
De acordo com o coordenador do curso de Engenharia de Produção, Wilson Mafra, a iniciativa tem três principais objetivos: aplicação prática, trabalho em equipe e estímulo ao espírito empreendedor.

O desafio envolveu toda a parte burocrática na abertura e gerenciamento da fábrica desde a elaboração do PCP (Programa e Controle de Produção), sistemas de produção e estudo de viabilidade do negócio. Dentre as equipes que desenvolveram o projeto, duas se destacaram: uma começou a produzir fraldas, a outra montou uma fábrica de chocolate.

Os estudantes Pricila Laureno, Jhonatan Tonello, Jeferson de Gasper e Diomar Schade já estão se dedicando à produção do doce. Eles aproveitaram que o laboratório da universidade possui os equipamentos necessários e tiveram apenas que adquirir a matéria prima.

“Tivemos que elaborar os turnos, escolher um público alvo, desenvolver o PCP, realmente como uma empresa”, detalha Jhonatan. De acordo com o planejamento, os empreendedores produzem 20 Kg de chocolate por dia, 500 Kg por mês. O custo é cerca de R$ 1,30 por unidade e o preço final fica em torno de R$ 2. “O preço não é tão baixo porque os bombons têm 80% de cacau e o nosso público alvo são as classes A e B”, explica Pricila.

Segundo o professor Mafra, o sistema produtivo está preparado para quem se interessar a assumir novos desafios. “Os próprios alunos, se quiserem continuar o negócio, já têm um planejamento pronto para ser usado em uma empresa”, afirma.

fonte: Correio do Pov0
 

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