quarta-feira, 13 de julho de 2011

VERGONHA: municipio de Espigão vai à Justiça para não fornecer medicamento a doente

“É dever do Estado”

om várias alegações, o Município de Espigão do Oeste foi ao Tribunal de Justiça de Rondônia para não fornecer medicamento imprescindível a vida de um homem. As autoridades queriam esquivar-se do atendimento mas intenção foi rejeitada pelo desembargador Renato Martins Mimessi, que, nesta terça-feira negou seguimento ao recurso de apelação.

Segundo os autos, o Município alegou que não era sua obrigação pelo fato do medicamento não constar na lista de fornecimento do SUS, quando poderia ser ressarcido dos custos. Alegou ainda que a responsabilidade era do Estado e não da Prefeitura.

Os argumentos foram derrubados pelo desembargador, ao lembrar que quando a Constituição define a responsabilidade do Estado, o faz em sentido amplo. “É dever do Estado lato sensu garantir o adimplemento da saúde dos administrados, do povo, de um modo geral, mediante a aquisição da medicação necessitada, cirurgias e demais tratamentos e materiais atinentes à área da saúde, enquanto a assistência mostrar-se necessária”, disse. CONFIRA ÍNTEGRA DA DECISÃO:

Despacho DO RELATOR
Apelação nrº 0004525-66.2010.8.22.0008
Apelante: Município de Espigão do Oeste - RO
Procuradora: Elisabeta Balbinot(OAB/RO 1253)
Apelado: Enilton Correia de Araújo
Defensor Público: Adelino Catâneo(OAB/RO 150B)
Relator:Des. Renato Martins Mimessi

Vistos.

Trata-se de apelação cível interposta pelo Município de Espigão do Oeste- RO (fl. 38), combatendo a sentença de fls. 33/36, prolatada pelo Juízo da 2ª Vara daquela Comarca que, em sede de Mandado de Segurança, determinou ao apelante que fornecesse medicamento imprescindível ao tratamento de saúde do impetrante, de forma gratuita e continuamente, pelo período de 12 meses, a partir do efetivo cumprimento da liminar.

Irresignado, apela requerendo a reforma da r. Sentença, para denegação da ordem, valendo-se das seguintes razões:

1 preliminarmente, alega inépcia da inicial, por ausência de recusa na entrega, portanto, por falta de prova pré-constituída; e

2 que o referido medicamento não consta da Portaria nº 2.982/2009, portanto, parte ilegítima para figurar no polo passivo.

Em contrarrazões o apelado pugna pela manutenção da decisão de primeiro grau.

O parecer da Procuradoria de Justiça (fl. 56/59) é pelo não provimento do recurso.

É o relatório. Decido.

No tocante a preliminar de inépcia da inicial, ante a falta de prova pré-constituída, ou seja, a ausência de recusa na entrega do medicamento ao paciente, esta não pode prosperar.

A negativa é de difícil comprovação, mas o fato é que foi ratificada nas informações da Procuradoria, ao expressar que não fornece o medicamento por não constar na Portaria n. 2982/2009, nos seguintes termos:

2.1 Da revogação da liminar concedida.

Que o medicamento solicitado não consta na portaria de obrigação do Município nº 2982/2009.
A condenação do Município no fornecimento de medicação que não consta na portaria acima mencionada, como no caso em tela extrapola a competência do município, comprometendo e trazendo grave lesão às finanças do erário municipal.

Desta forma, este tipo de medicamento que não consta em portarias são arcadas pelo Estado, a quem o Ministério da Saúde efetua o ressarcimento justamente para que não haja nas contas públicas, em razão da ausência de previsão orçamentária.
Nesse sentido colaciono o entendimento do Des. Walter Waltemberg Silva Junior:
A necessidade que o cidadão enfermo tem de obter o medicamento necessário à manutenção de sua saúde está intimamente correlacionado ao princípio da dignidade da pessoa humana, fundante da República e matriz de todos os direitos fundamentais. Assim, por tratar-se a saúde de um dos bens jurídicos mais relevantes para a existência humana, o formalismo processual deve ceder espaço.
É que o julgador deve resguardar a ¿máxima observância dos direitos fundamentais envolvidos, conjugando-a com a sua mínima restrição¿ (in LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. 13. ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 672). E não será por questões de índole processual que se mitigará um direito fundamental. A se pensar de modo diverso, vislumbro hipótese de negativa de jurisdição.
[...]

Dessa maneira, atento ao atual cenário da saúde pública do Brasil, ninguém pode negar a recusa e o retardo constantes do Poder Público no fornecimento de certos medicamentos, principalmente quando incomuns. Prova disso são os inúmeros mandados de segurança impetrados todos os dias neste Tribunal, os quais, inclusive, já são decididos de forma monocrática, com fundamento no art. 557 do CPC.
Em todo o Brasil, observa-se a utilização desta ação constitucional como meio de implementar o direito à saúde dos necessitados. E, se nesta ação o impetrante não fez prova da negativa ou retardo na resposta do pedido administrativo do medicamento, em diversas outras ações propostas e decididas todos os dias observa-se a omissão do Estado em relação ao pedido feito pela Defensoria.
Outrossim, constata-se que, em quase 100% das ações, nas informações prestadas pela autoridade impetrada (que até o momento não existe nesta ação), há a justificativa de que não fornecem o fármaco, porque não está previsto nas portarias do Ministério da Saúde, o que, por consequência, comprova o ato coator praticado. Essa é a experiência observada e não há como negá-la.
Desse modo, o fato do impetrante não ter demonstrado que a autoridade apontada como coatora negou-lhe o medicamento, não impede que se tenha por verdadeira a omissão alegada na inicial, pois é o que se observa no cotidiano das filas do SUS. Aliás, já tive a oportunidade de analisar mandado de segurança em que, segundo o impetrante, funcionários da própria Secretaria de Estado da Saúde informaram-no que, somente mediante ação judicial, seria possível o fornecimento do medicamento.
Dessa maneira, como o magistrado não está alheio aos acontecimentos da sociedade em que vive e porque os argumentos contidos na inicial são coerentes e verossímeis, outra medida não há, senão o acolhimento do pedido.
Com isso, ao evidenciar-se a violação aos direitos fundamentais, como ocorre no caso em análise (saúde e, por consequência, a vida), cabe ao Judiciário, por imperativo constitucional, atuar de forma a garantir o seu cumprimento e observância, a fim de atribuir concretude aos preceitos insculpidos nas normas constitucionais, principalmente à dignidade humana. (MS nº 0009856-53.2010.8.22.0000, Voto de vista, j. 23.11.10)

Assim sendo, rejeito a preliminar.

No que tange a responsabilidade do ente público, a matéria versada nestes autos já se encontra pacificada neste Tribunal, no sentido de que havendo necessidade de tratamento alopático, é dever do Estado lato sensu garantir o adimplemento da saúde dos administrados, do povo, de um modo geral, mediante a aquisição da medicação necessitada, cirurgias e demais tratamentos e materiais atinentes à área da saúde, enquanto a assistência mostrar-se necessária:

AC. MS. Fornecimento de produtos e medicamentos. Manutenção da sentença.

O fornecimento de produtos e medicamentos à pessoa desprovida de recursos financeiros é de responsabilidade dos entes federativos, de modo que qualquer um deles tenha legitimidade para figurar no polo passivo da demanda.

Deve ser confirmada a sentença que julgou procedente ação de mandado de segurança, obrigando o município a fornecer produtos e medicamentos essenciais à saúde do hipossuficiente. (Ap Civ em MS nº 0047340-18.2009.8.22.0007, Rel. Des. Walter Waltemberg Junior, j.19/11/2010 ).

O entendimento do Supremo Tribunal Federal a esse respeito é pacífico:

Direito Constitucional. Direito à saúde. Legitimação passiva ad causam. A obrigação de fornecimento de remédios, com base no art. 196 da CF, é de qualquer dos entes federativos, cabendo ao titular do direito subjetivo constitucional a escolha do demandado. (STF AGRG/RE n. 255.627-1/RS; Ministro Nelsom Jobim).

Nesse mesmo sentido, o Superior Tribunal de Justiça decidiu:

Esta Corte tem reconhecido aos portadores de moléstia graves, sem disponibilidade financeira para custear o seu tratamento, o direito de receber gratuitamente do Estado os medicamentos de comprovada necessidade. Precedentes, o direito à percepção de tais medicamentos decorre de garantias previstas na Constituição Federal, que vela pelo direito à vida (art. 5º, caput) e à saúde (art. 6º), competindo à União. Estados, Distrito Federal e Municípios o seu cuidado (art. 23, II), bem como a organização da seguridade social, garantindo a universalidade da cobertura e do atendimento (Art. 194, Parágrafo Único, I). A Carta Magna também dispõe que A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantindo mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação (art. 196), sendo que o atendimento integral é uma diretriz constitucional das ações e serviços públicos de saúde (art. 198).

Pelo exposto, diante da existência de jurisprudência pacífica acerca do tema, nego seguimento ao recurso. Faço-o monocraticamente, com supedâneo no art. 557 do Código de Processo Civil e art. 139, IV, do RITJ/RO.

Após o trânsito em julgado, devolva-se a origem.

Porto Velho - RO, 11 de julho de 2011.
Desembargador Renato Martins Mimessi
Relator

Fonte: RONDONIAGORA
Autor: RONDONIAGORA
fonte: http://www.rondoniagora.com/noticias/vergonha-municipio-de-espigao-vai-a-justica-para-nao-fornecer-medicamento-a-doente-2011-07-12.htm

 

Nenhum comentário:

Postar um comentário